Pesquisadores que trabalham em imunizantes de aplicação intranasal
explicam como a falta de incentivo à pesquisa no país impede o avanço de meios
mais eficazes para combater a Covid-19.
As vacinas de aplicação
intranasal, por meio de spray, são a grande aposta da ciência para barrar não
só a infecção, como também a transmissão do coronavírus, além de serem mais fáceis de
adaptar às novas variantes que surgem a todo momento, cada vez mais transmissíveis.Então,
o que falta para esse passo importante rumo ao fim da pandemia de Covid-19? Em
entrevista ao R7, pesquisadores que trabalham no
desenvolvimento de vacinas em spray nasal no Brasil explicam que a principal
barreira é a ausência de investimentos. Coordenador do estudo em andamento no
InCor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina
da USP), em São Paulo, Jorge Kalil afirma que até mesmo a permanência dos
cientistas na pesquisa é dificultada pela falta de verba.“Para que a gente
possa pagar a pessoa para trabalhar, tem que ser em forma de bolsa, valor que é
muito baixo, não existe nenhuma garantia de emprego. Então se [o pesquisador]
arruma um trabalho que seja com carteira assinada, ele vai embora”, afirma KalilApesar
de reconhecer que os recursos disponibilizados pelos centros de tecnologia e
inovação foram importantes para sua pesquisa, o coordenador do estudo destaca
que não é a regra no país. “Os recursos do Brasil para pesquisa são pequenos, e
também não existe o hábito das indústrias privadas de participar do processo de
desenvolvimento [dos estudos]. Normalmente elas pegam alguma coisa que já foi
totalmente desenvolvida no exterior”, diz Kalil. A vacina em spray nasal
desenvolvida por pesquisadores da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais)
segue a mesma toada, segundo o professor de bioquímica Dawidson Assis Gomes, do
Departamento de Bioquímica e Imunologia do Instituto de Ciências Biológicas da
instituição.“A principal dificuldade para o desenvolvimento da nossa vacina tem
sido a falta de recursos para um andamento mais rápido. Nosso projeto não teve
nenhum financiamento público ou privado até o momento, estamos desenvolvendo
nossa tecnologia somente com investimento do próprio laboratório”, afirma
Gomes.A vacina da UFMG ainda se encontra na fase pré-clínica com testes em
animais. No caso do imunizante desenvolvido pelo InCor, por outro lado, a
pesquisa em animais já foi finalizada, mas não há nenhum apoio industrial para
que os insumos sejam fabricados no Brasil e, assim, a vacina passe para a fase
de testes em humanos.Entenda como funcionam as vacinas em spray nasal As
vacinas de aplicação intranasal são vistas como a grande aposta para reforçar a
imunização contra a Covid-19 porque atacam o vírus logo na sua principal porta
de entrada no corpo: o nariz.Além disso, o imunizante em spray é capaz de
produzir a imunoglobulina A (IgA), anticorpo que desempenha papel importante no
combate ao vírus nas mucosas, como a nasal, onde o Sars-Cov-2 pode continuar se
replicando e sendo transmitido para mais pessoas mesmo que o indivíduo
infectado esteja assintomático. A IgA é pouco produzida nas vacinas injetáveis.Segundo
o professor Dawidson Assis Gomes, as vacinas de aplicação intranasal também têm
produção e transporte mais baratos, já que podem ser deslocadas em temperatura
ambiente, diferentemente dos imunizantes convencionais, que precisam de
refrigeração especial.“São mais seguras e convenientes de ser administradas. A
própria pessoa pode se medicar, como fazemos para aplicação de remédios por
spray nasal, como para rinite alérgica ou asma”, destaca o especialista.Vacinas
de aplicação intranasal desenvolvidas no Brasil A vacina que está sendo
desenvolvida na UFGM usa peptídeos sintéticos, que são pequenas partes das
proteínas do vírus, para induzir a produção de anticorpos contra o Sars-Cov-2.“A
nossa formulação já leva em consideração as variantes que andam aparecendo. A
utilização de peptídeos facilita a adaptação da formulação, caso uma variante
escape da proteção vacinal”, afirma o pesquisador.A tecnologia usada para a
produção da vacina é totalmente nacional, o que dispensa a necessidade de
importação de materiais e insumos, permitindo a fabricação em larga escala no
Brasil.“O sucesso que estamos tendo até o momento mostra que nossa tecnologia
tem um excepcional custo-benefício e que temos uma grande preocupação em
desenvolver um produto que possa ser acessível não só para o nosso país, mas
também para países de baixa renda”, afirma Gomes. Já a vacina em spray
desenvolvida por cientistas do InCor, sob a coordenação do professor Jorge
Kalil, usa a proteína RBD do Sars-Cov-2, diferentemente das vacinas de
aplicação intramuscular, que utilizam a proteína Spike.“O que interessa mesmo
para a indução de anticorpos neutralizantes é uma pequena porção da proteína
RBD, que é aqui [onde o vírus] se liga no receptor da célula humana para poder
penetrar. E todas as variantes de preocupação tiveram mutações na RBD”, explica
Kalil.Além disso, para a elaboração do imunizante foi usado um sistema de
bioinformática para selecionar dentro do genoma viral do Sars-Cov-2 36
proteínas capazes de estimular as células T, que são as responsáveis por
produzir a resposta celular contra a infecção.“Com isso fizemos uma proteína
híbrida que tem a RBD, mais fragmentos de células que estimulam células T.
[Além disso], podemos mudar a RBD de acordo com a variante em circulação,
[adaptando a vacina]. Nossa ideia é fazer para as pessoas vacinadas, então
servirá com uma dose de reforço no nariz para evitar não só a doença, mas a
infecção, ou seja, que o vírus não fique se multiplicando no nariz mesmo que
não cause doença”, destaca Kalil.O principal entrave do estudo neste momento,
no entanto, é o acesso à tecnologia usada para produzir a proteína. A equipe
está avaliando a compra do serviço no exterior, mas, segundo o pesquisador, há
uma sobrecarga mundial nos laboratórios que fazem esse tipo de desenvolvimento.“Começamos
a trabalhar com essa proposta de vacina intranasal já em março de 2020 e
sabíamos que não seríamos a primeira vacina [a ser utilizada], porque as
grandes companhias tinham se lançado em vacinas usando as plataformas que elas
já tinham à disposição”, afirma Kalil. Neste ano, a vacinação contra a gripe na
rede pública começou na segunda-feira (4) em todo o país. O Ministério da Saúde
prevê vacinar cerca de 75,6 milhões de pessoas que fazem parte dos grupos
prioritários. Veja nas próximas imagens quem pode ser imunizado e esclareça
outras dúvidas.( Foonte R 7 Noticias Brasil)