O valor considera R$ 6 bilhões que a Eletrobras quer cobrar para abrir
mão de sua participação na Eletronuclear, empresa responsável pelos
investimentos da usina de Angra 3, e outros R$ 6 bilhões em dívidas da
Eletronuclear -cujas garantias foram dadas pela Eletrobras e ficariam sob
responsabilidade da União.
(FOLHAPRESS) - O acordo para ampliar o poder da
União sobre a Eletrobras pode gerar um custo de R$ 12 bilhões para o governo
federal. Os cálculos alimentam o impasse dentro do governo de Luiz Inácio Lula
da Silva (PT) entre as alas que são a favor e contra a negociação. O
valor considera R$ 6 bilhões que a Eletrobras quer cobrar para abrir mão de sua
participação na Eletronuclear, empresa responsável pelos investimentos da usina
de Angra 3, e outros R$ 6 bilhões em dívidas da Eletronuclear -cujas garantias
foram dadas pela Eletrobras e ficariam sob responsabilidade da União. O montante não considera os custos para
concluir a construção de Angra 3, que podem chegar a R$ 26 bilhões, segundo
estimativas mais recentes. A fatura precisará ser bancada integralmente pelo
governo caso o projeto vá adiante. Pela composição acionária atual, a
Eletrobras responderia por 35,9% dessa responsabilidade, pouco mais de R$ 9
bilhões. Defensores da negociação dizem, sob reserva, que o montante a ser pago
pela União pela fatia na Eletronuclear ainda não está fechado e que o Executivo
busca um "valor mais acessível". O pagamento seria feito com ações da
União na Eletrobras. Além disso, um integrante do governo que apoia o acordo
afirma que o tema não pode ser analisado apenas sob o prisma fiscal ou
financeiro, mas sim "de maneira holística", ou seja, ampla. Para essa
ala, o maior número de assentos da União no conselho de administração da
Eletrobras compensaria qualquer eventual saldo "financeiramente ruim"
da transação. Outro interlocutor desse grupo argumenta que o valor das
garantias não representa um impacto a ser considerado diretamente na operação,
pois reflete, segundo essa visão, apenas um risco potencial. A equipe econômica,
por sua vez, resiste à negociação. A avaliação é de que não há justificativa
para a União assumir sozinha uma empresa endividada, que pode gerar mais
passivos e ainda pagar por isso, abrindo mão de uma fatia na Eletrobras -uma
empresa saudável e lucrativa. Um relatório do Itaú BBA distribuído a clientes
nesta quarta-feira (31), ao qual a Folha teve acesso, diz que "transferir
sua fatia na Eletronuclear, mesmo que por zero reais, ainda seria muito
positivo para a Eletrobras porque isso remove um grande risco para seu plano de
investimentos". Na visão dos analistas, apenas livrar a companhia desse
passivo, sem receber nada em troca, já seria um ganho para seus acionistas. Mesmo
assim, a Eletrobras quer cobrar da União para se desfazer da participação.
Segundo dois interlocutores que acompanham as negociações, a primeira oferta
foi cobrar pouco mais de R$ 7 bilhões, equivalente ao valor patrimonial da
participação da companhia na Eletronuclear. Essa proposta, porém, já foi
descartada pelo Executivo, que quer desconto no pagamento. Além disso, na visão
da equipe econômica, as garantias representam um passivo pelo qual a União
responderá no futuro, caso a transação vá adiante, e precisam ser consideradas
na conta. As garantias incluem R$ 3,2 bilhões devidos ao BNDES (Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social) e outros R$ 2,8 bilhões à Caixa. Os
valores foram contratados para erguer Angra 3. A construção da usina, em Angra
dos Reis (RJ), foi interrompida duas vezes. A paralisação mais recente ocorreu
em 2015, devido aos esquemas de corrupção investigados pela operação Lava Jato.
Naquele momento, cerca de 60% da obra estava pronta. Diante do impasse nas
negociações, a AGU (Advocacia-Geral da União) e a Eletrobras pediram ao STF
(Supremo Tribunal Federal) um prazo adicional de 45 dias para tentar construir
uma solução amigável. Uma nova reunião para discutir o tema deve ocorrer na
semana que vem. No pedido enviado nesta quinta (1º), a AGU afirmou que as
tratativas estão em "fase conclusiva", mas que o caso traz
complexidade intrínseca que "exige a discussão e a finalização minuciosa
de alguns pontos cruciais". A negociação faz parte do plano do governo
Lula de tentar ampliar sua influência sobre os rumos da companhia. O presidente
é crítico da privatização da Eletrobras. A União tem hoje um único
representante no conselho de administração, apesar de ser acionista
majoritária, com 43% das ações. Isso acontece porque a lei da privatização e o
estatuto da empresa limitaram o exercício de voto a 10% do capital social. O
acordo em discussão prevê a ampliação do número de assentos no colegiado de 9
para 10, dos quais três seriam indicados pela União (que ficaria com 30% dos
votos). O governo almejava uma quarta vaga, que deve ficar no conselho fiscal. A
disposição do governo Lula em assumir os custos bilionários da Eletronuclear em
troca do maior poder de influência na Eletrobras pode vir a ser analisada pelo
TCU (Tribunal de Contas da União), que acompanhou de perto o processo de
privatização da companhia, concluído em 2022. O ponto central para a equipe
econômica é que, na época da privatização, todas as modelagens consideravam a
existência desse passivo no balanço da empresa. Isso foi uma variável decisiva
para dois preços-chave: o valor que a União recebeu pela renovação antecipada
das concessões de usinas e o valor que os investidores pagaram pela ação da
companhia. Ambos tiveram descontos devido ao fato de que a Eletrobras manteve
em seu balanço os riscos atrelados à estatal nuclear. Técnicos que participaram
da construção do modelo da privatização afirmam, sob reserva, que a União abriu
mão de receber um valor maior naquele momento em troca de dividir o risco de
Angra 3 com a iniciativa privada. Permitir à Eletrobras sair do investimento
seria, na avaliação desses técnicos, um alto preço a se pagar pelos assentos no
conselho de administração. Em relatório, o Itaú BBA ressaltou que dar à União
três vagas no colegiado é pior que o inicialmente esperado, mas não muito
negativo. "O governo federal ainda não teria grande influência no conselho
e continuaria a ter um direito de voto limitado a 10% na assembleia de
acionistas. A companhia ainda poderia ser administrada com uma visão de
iniciativa privada", diz o documento. O ministro Alexandre Silveira (Minas
e Energia) disse nesta quinta que o acordo ainda depende de discussão. "É
um pleito da Eletrobras [sair de Angra 3]. A forma como vai se desdobrar isso e
vai se finalizar o acordo vai ainda depender de muitas [variáveis]",
afirmou. "O acordo é muito difuso, então ainda vai depender de muitas
sentadas e, por isso, nós pedimos uma dilação de prazo em 45 dias. Mas eu
particularmente estou muito otimista." Procurados, Fazenda, Casa Civil e
Eletrobras não se manifestaram. Leia Também: Agenda
do STF: orçamento secreto, 'PEC Kamikaze' e Eletrobras na pauta da semana.
(Fonte Economia ao Minuto Noticias )