Tendências e soluções para a descarbonização do setor de transporte.
O Instituto Democracia e Sociedade (IDS) e o Insper se uniram
para promover uma série de diálogos sobre o Plano de Transição para a Economia
Verde. O objetivo é buscar, através da composição de conhecimentos, expertises
e diversidade uma visão multifacetada e que reflita a complexidade em cada
setor econômico. No mês de agosto de 2024 o tema foi Transportes. Na abertura,
a pesquisadora do IDS Carolina Marchiori fala sobre a necessidade de que essa
nova economia vá além de questões ambientais e climática, mas que contribua de
forma decisiva para a geração de renda e empregos. Para isso o IDS está
convidando, todos os meses, especialistas nos mais diversos temas da economia
para uma abordagem de transição para o cumprimento de metas de redução de
carbono, cuidados com a saúde e qualidade de vida, entre outros objetivos. Os
dois eventos anteriores trataram do Plano de Transformação Ecológica e o
segundo sobre a transição em energia. Esse projeto é parte das ações do IDS
para a construção de um Taxonomia da Economia Verde e da incidência da
organização sobre a Reforma Tributária em direção à uma economia mais
sustentável. O presidente do IDS, Ricardo Young, reafirmou a importância do
Plano de Transição Ecológica, que considera ser o primeiro passo concreto do
governo em direção a objetivos claros para uma economia sustentável. Para ele,
os diálogos promovidos pelo IDS e o Insper são uma contribuição que a sociedade
civil e a academia trazem para o ajuste das propostas em debate em Brasília.
Ele reafirma que o Brasil tem as principais vantagens competitivas e
comparativas no campo da sustentabilidade. Para garantir a diversidade do
diálogo foram convidados representantes de três setores chaves para o avanço
deste diálogo sobre o setor de Transporte:Adalberto Maluf – Secretário Nacional
de Meio Ambiente Urbano e Qualidade Ambiental Ministério do Meio Ambiente e
Mudança do Clima;Profª. Drª. Flávia Luciane Consoni de Mello – professora
Livre-docente do Programa de Pós-Graduação em Política Científica e Tecnológica
do Instituto de Geociências da Unicamp;Evando Gussi – CEO na ÚNICA e deputado
federal. O Transporte e as cidades O Secretário Nacional de Ambiente Urbano, Adalberto
Maluf, conta que há muitas coisas acontecendo em várias áreas do Governo
Federal com foco em descarbonização. Uma das atividades é a Oficina
Participativa do Programa Cidades Verdes e Resilientes, um programa novo que
integra as ações do Ministério do Meio Ambiente, Ministério das Cidades e
Ministério de Ciência e Tecnologia. O objetivo é compreender os diversos vieses
da qualidade de vida nas cidades, que tem a ver com áreas verdes, uso e
ocupação do solo, baixo carbono, economia circular e muito mais. A mobilidade
urbana e o transporte de cargas são responsáveis por grande parte das emissões
de particulados e CO² nas cidades e é foco de preocupação também, explica. O
Brasil, mesmo não tendo na mobilidade de pessoas e cargas o maior vetor de suas
emissões de CO², foi escolhido para a vice-presidência da Coalisão Clima e Ar
Limpo do Pnuma (Programa de Meio Ambiente da ONU). A presidência ficou com os
Estados Unidos e essa coalizão administra recursos da ordem de US$ 200 milhões
em projetos de combate e controle de poluentes climáticos de vida curta, como o
carbono negro, metano, SO² e os HFCs. Maluf explica que, em tese, na última COP
foi aprovado um fundo de US$ 2 bilhões para ser gerido pela Coalizão, mas esse
dinheiro ainda não chegou. Enquanto isso, o principal foco de combate às
emissões no Brasil é o desmatamento, responsável pelo maior volume de emissões.
A área de transporte fica com 16% das emissões totais do Brasil. “A preocupação
maior em relação às cidades é com a qualidade do ar”, explica o secretário. Ele
lembra que recentemente o presidente Lula assinou a Política Nacional de
Qualidade do Ar e a resolução CONAMA que entra em vigor em janeiro de 2025. Em
relação ao transporte, Maluf explica que os avanços em relação à qualidade do
diesel e os padrões de exigência de redução de emissões para automóveis
continuam sendo atualizados constantemente. No entanto as regulamentações têm
furos, como, por exemplo, a motocicletas, que tiveram diminuído o tempo de vida
útil dos catalisadores, a falta de regras para motores estacionários e a falta
de atualização para máquinas agrícolas e equipamentos de mineração. Então, diz
Maluf, na falta de legislação específica, o que a ministra Marina Silva vem
tentando fazer é que a legislação de qualidade do ar seja indutora de políticas
de controle de qualidade de motores e de combustíveis.Em relação ao Plano
Nacional de Mobilidade Elétrica, que foi proposto ainda no governo Temer, ele
nunca avançou e ainda está engavetado. Mas, o Brasil tem um outro diferencial,
os biocombustíveis. O país é muito competitivo na produção de etanol, o que
abre o espaço para os veículos híbridos elétricos/etanol. O etanol tem baixa
emissão de particulados e um balanço positivo nas emissões de CO². No entanto,
tem problemas com ozônio e Nox, que impactam a formação de ozônio na
troposfera.“Os motores flex não permitem uma calibragem 100% para nenhum dos
dois combustíveis”, explica Maluf. Em algum momento temos de trabalhar sobre
isso e, talvez, eliminar a opção pelo uso de gasolina. “Assim melhoramos o
desempenho em termos de emissões e poluição geral”. Ele lembra que é preciso
olhar para a frota circulante já existente e que precisa ser descarbonizada.
“Nós já temos a solução, é fortalecer o uso de etanol e melhorar a regulagem
dos motores”, explica. Para Maluf a busca por novas tecnologias, mais modernas,
é necessária, mas a realidade de uma enorme frota em circulação se impõe. O Clima e a
Saúde pública no centro do debate A professora Flávia Luciane Consoni de Mello coloca que existem
questões estruturantes na preparação de uma transição para o futuro, tanto em
termos de motivações, como em objetivos. A professora explica que há questões
de saúde pública, de mudanças climáticas, qualidade do ar. E a necessidade de
preparação estratégica da indústria, do setor de serviços e, também, a
preparação das pessoas para trabalharem com as novas tecnologias. Isso sem
falar em segurança energética, que deve ficar sempre no radar.Ela destaca a
necessidade de se olhar para dois cenários. Um deles é o que temos hoje no
Brasil em termos de modais. Uma frota de 63 milhões de veículos e quando
olhamos para todos os modais o número fica ainda mais expressivo. Então, é
preciso conciliar o presente e o futuro. Ela afirma que o biocombustível é uma
opção presente. O mundo está olhando de uma
forma incisiva para a eletrificação do transporte. Mas não dá para olhar apenas
para o automóvel, tem de caminhar junto com o planejamento urbano, a criação de
eletropostos e outros detalhes. No entanto, a professora alerta que não se
trata da eliminação de motores a combustão, mas sim de se eliminar o uso de
combustíveis fósseis até 2035, que é o compromisso geral. Isso abre espaço para
o diesel sintético, para o biodiesel, áreas em que o Brasil tem grande
potencial. Outro
ponto importante quando se pensa em transição tecnológica na área de
transportes, é preciso olhar para a América Latina, países para os quais a
indústria brasileira exporta toda classe de veículos; O que eles estão fazendo?
Para que lado estão planejando o futuro? A professora Consoni alerta para o
cenário da indústria, especialmente porque, segundo ela, todos os planos de
eletrificação apontam para o setor de transporte coletivo e o Brasil tem uma
enorme indústria de produção de ônibus que exporta para diversas partes do
mundo e não apenas para a América Latina. Essa transição é um processo de
mudança, um processo gradual em que o país tem que se preparar, em que a
indústria precisa de capacitação de recursos humanos, de formação de
profissionais com competências tecnológicas, produtivas, comerciais e
organizacionais que demandam um tempo considerável. Além disso, a produção
precisa ganhar escala. Ela pergunta: “Em que momento que o país vai se preparar
para atender esse mercado?”. O objetivo deve ser a descarbonização Evandro Gussi, presidente da
Única, um conglomerado de produção de biocombustíveis, incluiu uma nova
variável da discussão em torno de modais de transportes e tecnologias para a mobilidade.
Ele acredita que está havendo uma “confusão organizada” entre que é uma
tendência e qual a resposta tecnológica para se atingir o objetivo dessa
tendência. Para ele, a questão principal são as mudanças climáticas e a
necessidade de redução de emissões de CO² e a tendência é a descarbonização. A
tendência não é a eletrificação ou o etanol. A tendência é conseguir a menor
emissão por km rodado, de preferência, emissão zero. Gussi diz que esteve na
COP15. Em Paris, para aprender e entender como funcionam essas conferências. Na
época era deputado federal e acompanhou atento às discussões que levaram à
assinatura do Acordo de Paris. “Para mim o que foi decidido não é se vamos
eletrificar ou utilizar biocombustíveis. O que está em questão é a rápida e drástica
redução das emissões de gases estufa”. Ele cita o primeiro ministro alemão,
Olaf Scholz, que vem dizendo que, diferente de 15 anos atrás, quando queríamos
inovações e tecnologias disruptivas, hoje temos de ver o que já está pronto,
mais rápido e mais barato afinal, os prazos para se cumprir as metas do Acordo
de Paris já estão chegando ao fim. O presidente da Única aponta que a demanda é
descarbonizar e o que existe é uma variedade de alternativas. Uma delas já está
rodando e tem um enorme potencial de melhoria e crescimento, que é o uso de
biocombustíveis. Pode não ser o destino final, mas é, como disse o primeiro
ministro alemão, um produto que já está na prateleira. Investimento no
transporte coletivo Para o presidente do IDS, Ricardo Young, um caminho a ser
seguido é o aporte de recursos para a expansão e melhoria do transporte
público, especialmente sobre trilhos. Ele diz que diagnósticos apresentados
pelo BNDES e pelo Ministério das cidades apontam a necessidade de investimentos
em infraestrutura e logística em 29 regiões metropolitanas no Brasil. Esse
seria uma das vertentes importantes para a realização do programa Cidades
Verdes e Resilientes. Investimentos especialmente em mobilidade sobre trilhos. Ao
final fica claro que problemas complexos não suportam soluções simplistas ou
exclusivas. Como disse Evandro Gussi, é preciso ter as diversas tecnologias,
inovações e produtos na prateleira e ir utilizando conforme o cenário, a
oportunidade e a adequação ao contexto. Há equações tributárias e de custos que
precisam ser solucionadas, entre outras tantas variáveis, como parque
industrial instalado, qualificação de profissionais para novos processos e
manutenção, adequação de redes e infraestruturas e tudo o mais que deve
pavimentar um futuro de baixo carbono em uma economia verde. (IDS Brasil). Instituto Democracia e
Sustentabilidade para o Portal Eco.(Fonte Jornal Contexto Noticias GO)