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sábado, 19 de fevereiro de 2022

VIDANEWS - Empresas apostam na importação de cadáveres dos EUA; entenda.

 

Demanda por treinamentos mais sofisticados na área da saúde fez surgir empresas especializadas em importar corpos dos EUA.

Quanta vida há em um cadáver? Para estudantes da área da saúde, a possibilidade de estudar técnicas em um corpo com tecidos, músculos, pele e ossos frescos significa aperfeiçoar o aprendizado de técnicas simples, como a dissecação e sutura, até as mais complexas, como neurocirurgias. Até pouco tempo, treinamentos usando cadáveres de pessoas que acabaram de morrer só aconteciam fora do Brasil, mas a alta demanda da indústria médica acabou criando um novo nicho de mercado, em que empresas importam corpos congelados para a realização de treinamentos. É o chamado cadáver lab. Leia também: Inteligência artificial já faz parte do dia a dia da medicina O R7 apurou que um pé custa R$ 2 mil, um tronco, entre R$ 10 mil e 15 mil, uma mão pode valer R$ 1 mil, e uma cabeça com pescoço cerca de R$ 25 mil. Os valores não são cobrados pela peça, já que vender corpos humanos ou parte deles é ilegal, mas pelo serviço dos bancos de tecidos, preparação do cadáver, documentação, transporte e impostos. Larissa Nóbrega, gerente de projetos do Instituto HLA (Health Learning Academy), especializado em treinamento com cadáveres frescos explica que as empresas não pagam pelos membros em si. "O que nós pagamos é como um aluguel, nós não podemos comprar cadáveres e nem os bancos de tecidos podem vender. Ao mesmo tempo, a peça em si não tem um valor certo, tudo depende de uma série de variantes. Por exemplo, um corpo inteiro de uma pessoa de 80 quilos, obviamente, vai custar mais que uma pessoa que pesa 60 quilos", comenta. O que é possível dizer é que os cursos em cadáver lab também não são baratos. No HLA, um curso de até três dias variam entre R$ 6 mil e R$ 40 mil por pessoa, dependendo da técnica e da quantidade de peças necessárias para o treinamento. Apesar de cara, a opção ainda é mais viável que enviar profissionais para treinamento nos Estados Unidos. "Há sete anos, eu trabalhava como distribuidor de um marca-passo cerebral para a doença de Parkinson e um medular para dor crônica intratável. No entanto, para treinar os neurocirurgiões para a técnica, eu precisava levá-los para os Estados Unidos, ficava muito caro e eu conseguia treinar poucas pessoas", diz o presidente do HLA, Luciano González. "Por isso, decidi criar o instituto e começar a importar os espécimes, hoje, estamos rivalizando com os Estados Unidos em treinamento de cadáveres frescos", completa Luciano González, que prefere chamar os cadáveres de "peças anatômicas". Uma tentativa de tornar o tema menos mórbido e mais próximo da linguagem da pesquisa científica.  Leia também: Biocurativo feito em impressora 3D é o futuro para tratar queimados "Aqui no Brasil, a palavra cadáver tem uma conotação de morte. Nos Estados Unidos, é um objeto de estudo. É totalmente uma questão cultural, a gente trata as peças com todo o respeito do mundo, há um processo operacional padrão para isso", completa o presidente do instituto. Atualmente, a empresa faz importação para todo o Brasil e realiza treinamentos em Brasília (DF), Curitiba (PA), Juiz de Fora (MG) e São Paulo. Entenda o procedimento O método consiste no congelamento do corpo logo após a morte, e é comum em países como os Estados Unidos. Antes de enviados, os tecidos são testados para doenças infecciosas, como Covid-19, HIV, Hepatite B e C, e utilizados só após resultados negativos.  A rapidez no congelamento após a morte preserva as características dos tecidos humanos, possibilitando que no processo de descongelamento cirúrgico a estrutura do cadáver permaneça praticamente inalterada, como se ainda estivesse vivo, chegando até mesmo a sangrar. O que não é possível na aplicação em manequins de silicone ou material sintético, por exemplo. E nem mesmo em cadáveres conservados por meio de produtos químicos, como o formol que enrigece os tecidos do corpo. O cirurgião plástico André Cervantes, diretor cientifico da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, afirma que esse é o melhor método para treinar todas as especialidades cirúrgicas. "Antes existia uma restrição no Brasil quanto ao uso de cadáveres frescos, mas que hoje é uma realidade, e que tem como missão capacitar de uma forma melhor os médicos. Conhecendo a anatomia e simulando procedimentos nessas peças, é possível prestar um serviço médico mais seguro", diz o cirurgião, que também usa espécimes importados para ministrar cursos em anatomia da face voltados para cirurgia plástica. Ele explica que ainda há um ponto limitante na legislação brasileira quanto à doação de corpos. Isso porque, atualmente, mesmo que uma pessoa queira doar seu corpo para fins de estudo e pesquisa, é necessário que a conservação do cadáver seja feita em formol.  "Uma pessoa pode ter passado por todo o trâmite para doar seu corpo em vida, mas esses corpos acabam sendo conservados em formol. Isso é ruim porque a característica do tecido muda completamente, fica mais duro e mais escuro, faz parte do processo da reação química. Isso é diferente do que chamamos de fresh frozen cadavers, que são pessoas que foram congeladas assim que morreram", detalha. Leia também: Cientistas estudam na Antártida moléculas contra o câncer Imediatamente quando começa o processo de putrefação, ou quando o trabalho de pesquisa é encerrado, as peças são incineradas e devolvidas ao banco de tecidos. Doação de corpos no Brasil Atualmente, duas legislações tratam do tema no Brasil. A Lei 8.501, de 1992, dispõe sobre a destinação do cadáver não reclamado para fins de ensino e pesquisa. Já a Lei 10.406, de janeiro de 2002, estabelece que qualquer pessoa pode dispor de seu próprio corpo para uso científico após a morte. Dez anos após a criação da última regra, ainda não há uma normatização nacional para as doações, por isso a forma de doar pode variar dependendo do estado.  Professora de anatomia por 45 anos, Jussara Rocha Ferreira explica que a qualidade das peças anatômicas usadas em laboratórios está diretamente ligada ao nível da educação oferecida nas universidades brasileiras. Ela explica que há peças em diferentes estados de conservação e até mesmo os corpos mais antigos são utilizados pelos alunos. Na coleção de 6 mil ossos do acervo da UnB (Universidade de Brasília), por exemplo, há peças que são estudadas há mais de 50 anos. "O direito à formação profissional é dever do estado. Você não pode fazer com que profissionais de medicina saiam da faculdade sem competência para exercer a profissão", comenta a professora, que foi a responsável pela catalogação dos acervos dos museus de Anatomia Humana tanto na UnB quanto na Universidade Federal de Goiás. Para ela, existe uma lacuna na legislação brasileira e falta regulamentação nacional da doação de corpos no Brasil. "É necessário que os estados sentem à mesa para regulamentar o uso de corpos para pesquisa a nivel nacional. É algo tão básico, mas, infelizmente, não damos o devido valor ao tema, nem estamos civilizados o suficiente para adentrar nessas questões", diz. Doações no Distrito Federal Em 2021, 11 corpos foram doados a instituições de ensino no Distrito Federal. Na capital do país, o trâmite é regulamentado por uma portaria do Ministério Público do DF de 2010. Excluindo as mortes violentas e por acidente, que seguem técnicas específicas de perícia, não existem causas que dificultam a doação de corpos.  Em primeiro lugar, explica o MP, é necessário que o doador manifeste em vida a vontade de doar o corpo para uma instituição de ensino. Para isso, basta informar a família sobre o desejo e procurar a promotoria Pró-Vida, onde vai preencher uma ficha e receber orientações. Após a morte, os familiares devem informar ao hospital, IML ou Serviço de Verificação de Óbito que há intenção de doação do corpo, e, na sequência, entrar em contato com a promotoria por telefone ou e-mail. Leia também: Silicone com chip guarda informações de pacientes por até 20 anos A promotoria mantém uma lista com oito instituições com cursos de medicina e enfermagem cadastradas e aptas a receber os cadáveres no DF. Os corpos que chegam são distribuídos na ordem da lista de faculdades, da primeira até a última, depois volta para o início.Após o falecimento, o velório do doador pode ser realizado normalmente. O que muda é que ao invés de se dirigir para um cemitério ou crematório, o corpo vai para a instituição de ensino escolhida. "É importante destacar que o interessado deve comunicar e discutir amplamente a sua intenção com os familiares mais próximos, uma vez que serão eles que acionarão a estrutura do MPDFT, informando o óbito e tomando os procedimentos iniciais para a doação", enfatiza o órgão.( Fonte R 7 Noticias Brasil)

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