Homens se revezam para dormir e manter as mulheres seguras, já que há muitos relatos de estupros e abusos sexuais .
Nas ruas de terra nada sinalizadas e ao lado de suas casas, com
as estruturas comprometidas pelo terremoto que atingiu o Sudoeste do Haiti no
último dia 14, moradores de Les Cayes, a terceira maior cidade do país, têm
dormido sobre o asfalto após a tragédia natural. Leia também: Gangues do Haiti
abrem caminho para ajuda humanitária no País Eles
temem que novas réplicas, que têm ocorrido em média duas vezes por dia na
região, possam acontecer enquanto dormem, à noite ou durante a madrugada,
podendo ceifar aquilo que ainda conseguem ter: Suas próprias vidas. E para as
mulheres é ainda pior. Com as ruas escuras, casos de violência sexual têm sido
citados com frequência pela população. As que são casadas, quando o sol se põe,
se preparam para dormir em cadeiras, tendas ou sobre lençóis postos no chão com
os filhos. Enquanto isso, os homens se revezam, dormindo sentados, para fazer a
segurança da família. É isso o que relata o eletricista Jean Louis Wilfranc, de
41 anos. "Nós não conseguimos dormir uma noite com sono direto desde que
aconteceu [o terremoto]. Nos revezamos entre vizinhos para que nada de mal
aconteça", diz. Sua principal ambição de vida, para o momento, é conseguir
uma doação de barraca. Leia mais: Haitianos buscam
trabalho sobre escombros para sobreviver A casa de
Wilfranc, onde ele relata viver desde que nasceu, está com várias fissuras.
Algumas vigas chegaram a entornar. É a segunda vez que um terremoto causou
avarias em sua residência. "Desta vez foi pior. Da outra vez, consegui
fazer pequenos reparos. Agora, não sei o que vou fazer", afirma. Ao
perceber que seu vizinho era entrevistado, o administrador de empresas Darbuze
Jean Horl, de 42 anos, se aproxima e desabafa. "Eu vivo aqui com minha
mulher e dois filhos. Imagina você ver seus filhos e sua mulher dormindo na
rua. Isso me toca como humano. Me falta dignidade humana. A gente não gostaria
de estar nessas condições, mas é a vida", diz. Conforme o horário vai
avançando e a noite começa a se aproximar da madrugada, as esquinas da cidade
passam a ter várias barricadas formadas com entulho. Os bloqueios são feitos
pelos próprios moradores, para que diminuam os riscos de atropelamento da
população que dorme sobre o asfalto. A tragédia atingou até mesmo aqueles que
têm uma condição social um pouco melhor. Frantz Gregoire, de 55 anos, afirma
ter estudado administração de empresas na Universidade de Massachussetts, nos
EUA, e ter servido à Marinha norte-americana entre os anos de 1985 e de 1989. Morador
de um apartamento em um edifício de dois andares ao lado situado ao lado do
mar, ele já começou a reconstruir as estruturas danificadas pelo tremor e suas
réplicas. Enquanto sua casa continua insegura para se viver, criou uma pequena
ocupação na esquina onde vive. Duas tendas espaçosas foram colocadas no meio da
rua. Sobre elas, uma lona azul foi colocada, para evitar que o sol, durante a
tarde, gere incômodo. À noite, enquanto as mulheres e as crianças dormem, os
homens colocam cadeiras em frente à televisão e assistem uma novela coreana.
Diferentemente da programação televisiva da tarde, que costuma mostrar
programas esportivos. O assunto interessa muito a Gregoire. Afinal, além de
administrador, ele também é presidente da liga de futebol de Les Cayes. Com
inglês fluente, ele afirma que sempre volta para os EUA, mas que se mantém
residente no Haiti por amar o país e, principalmente, a cidade de Les Cayes.
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