No Dia
Mundial de Conscientização do Autismo, entenda os principais sintomas do
transtorno e como ele é identificado.
“Uma das coisas que me levaram
a procurar atendimento profissional foi o fato de chegar aos 18 anos e não ter
amigos.” A fala de Tiago Abreu, de 26 anos, é sintomática da realidade das
pessoas que recebem o diagnóstico de autismo apenas na idade adulta e,
durante muitos anos, vivem sem entender por que se sentem socialmente
desconexas. O TEA (transtorno do espectro autista) pode se apresentar de
diversas formas e intensidades, mas a dificuldade de comunicação e interação
social é geralmente uma característica compartilhada por todos os autistas,
conforme explica a neuropsicóloga Joana Portolese, coordenadora do Ambulatório
de Autismo do Instituto de Psiquiatria do HCFMUSP (Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo). “O autismo é um transtorno
relativamente comum, praticamente uma a cada 44 crianças tem. O diagnóstico é
importante porque trabalha no sintoma que são as dificuldades de entender o que
está se passando na cabeça do outro, as sutilezas, as entrelinhas, entender as
pessoas se olhando. Porque são processos que já são alterados desde a amamentação
do bebê com a mãe”, ressalta a especialista. O autismo pode ser diagnosticado
desde os 16 meses da criança, segundo a neuropsicóloga, mas, em geral, as
primeiras observações por parte dos pais são relatadas a partir do segundo ano
de vida, e o diagnóstico na infância ocorre por volta dos 4 anos. “Já aos
6 meses podemos observar algumas características, como poucas expressões
faciais, baixo contato ocular, ausência de sorriso social e pouco engajamento
sociocomunicativo. Geralmente as mães falam que chamam, dão risada, e a criança
não responde, e isso acaba sendo um círculo vicioso em que a mãe também deixa
de estimular por pensar que é o jeitinho do bebê”, explica Joana. Além disso, a
falta de gestos convencionais, como dar tchau, falar as primeiras palavras, ou
mesmo movimentos motores repetitivos durante os primeiros anos de vida da
criança também podem ser indicativos do transtorno. “Até a percepção dos pais
chegar à efetividade de um diagnóstico, levamos de quatro a cinco anos, e isso
significa que acabamos perdendo uma janela de desenvolvimento dessa criança,
que é um momento muito rico do desenvolvimento cerebral. Esses primeiros anos
são muito importantes para estimular e para intervir, porque o
diagnóstico precoce vai possibilitar que os pais busquem informações
consistentes sobre autismo e também que se capacitem para essa estimulação”,
afirma a médica. No caso de Tiago, que comanda o primeiro podcast brasileiro
produzido e apresentado por autistas – o Introvertendo –, o
diagnóstico aos 19 anos proporcionou não apenas a melhora da qualidade de vida,
como um mergulho no autoconhecimento. “O diagnóstico de autismo não foi um
rótulo, foi a constatação de várias coisas na [minha] vida que já existiam e
não tinham um nome. De lá pra cá, têm sido os melhores
anos da minha vida, pude construir mais amizades, minha vida social mudou
bastante e comecei a desenvolver mais habilidades”, afirma. Além de podcaster,
ele é autor do livro “O que É Neurodiversidade?”, termo usado pela primeira vez
em 1998 pela socióloga australiana Judy Singer, que aborda o autismo e outros
transtornos neurológicos como características inerentes ao ser humano, e não
como doenças que precisam de cura. O termo também dá nome ao movimento que atua
pela busca de direitos e para desestigmatizar os transtornos do
neurodesenvolvimento. Para Tiago, abordar o tema em primeira pessoa é
importante para aproximar o autismo do cotidiano e
fortalecer as pessoas que se identificam ou são identificadas com o
diagnóstico. “O autismo está no dia a dia das pessoas, só que muitas vezes elas
não percebem, às vezes é um colega de trabalho ou um parente que é meio
esquisito, mas de quem se sabe muito pouco, porque são pessoas que tiveram ao
longo da vida vários problemas de socialização e de baixa autoestima muitas
vezes por causa das dificuldades que enfrentaram. As experiências de outros
autistas ajudam essas pessoas a se conhecerem e a melhorarem a sua jornada”,
afirma Joana Portolese. Como é feito o diagnóstico Não
existe um exame específico para diagnosticar o autismo, e sim uma série de
avaliações que preenchem requisitos sintomáticos do espectro. Entre essas
avaliações está a neuropsicológica, que considera o nível cognitivo e a demanda
da cognição social da pessoa; ou mesmo a avaliação fonoaudiológica, para
observar a linguagem e o repertório para a comunicação. O diagnóstico é feito
por um psiquiatra da infância e adolescência, por um neuropediatra ou um
neurologista. “Muitas vezes o médico pode dizer que não vai fechar um
diagnóstico, que o quadro não é tão claro, mas essa intervenção precoce vai
fazer a diferença. Hoje as intervenções visam a abordar os prejuízos centrais
associados ao autismo”, explica Joana. As intervenções baseadas em evidências
podem ser a ABA (análise do comportamento aplicada, na tradução do inglês), a
terapia cognitiva comportamental, exercícios como musicoterapia e integração
sensorial, intervenção fonoaudiológica e, em alguns casos, a criança pode
precisar de um acompanhante terapêutico na escola para um melhor aproveitamento
no aprendizado. No caso das crianças, a especialista ressalta que elas
podem apresentar dificuldade na linguagem, no comportamento adaptativo e no
desempenho acadêmico, além de comportamentos disruptivos e episódios com
rompantes de agressividade, o que influencia na aprendizagem e na qualidade de
vida. “Em crianças diagnosticadas com autismo por volta dos 6 anos, encontramos
uma frequência alta de transtorno de ansiedade, de déficit de atenção e
hiperatividade, fobias específicas e também o transtorno opositor desafiador.
Já no adulto, geralmente ansiedade, fobia social, depressão e o transtorno
obsessivo compulsivo. No autismo, a comorbidade acaba sendo regra”, afirma a
especialista. Os graus do autismo A neuropsicóloga Joana
Portolese explica que a forma como o autismo se apresenta pode ser dividida em
três graus: leve, moderado e severo. Em geral, as pessoas que recebem o
diagnóstico na idade adulta são aquelas inseridas no grau
leve e não apresentam prejuízo na fala. “São aqueles casos
em que os pais contam que a criança falou supercedo ou falava às vezes de um
jeito peculiar, como um professor. Também são pessoas que falam sem pausas ou
falam em um tom específico, não tem uma regra. Essas pessoas também não têm
deficiência intelectual”, destaca a médica.Além disso, os autistas inseridos no
grau leve podem ter comorbidades psiquiátricas, como déficit de atenção e
hiperatividade, transtorno de ansiedade e depressão. Joana destaca que, nesses
casos, é comum que as pessoas dentro do espectro que não receberam o
diagnóstico busquem tratamento para essas comorbidades, mas não obtenham uma
melhora do quadro.“Não é porque o diagnóstico veio na vida adulta que o caso
dessa pessoa é tão leve assim, ela sempre se sentiu diferente e preferiu ficar
mais em casa, envolvida nas atividades de interesse. Essas pessoas vão se
adaptando às situações. É muito comum o paciente falar que entende o que é uma
piada, não vê graça, mas, quando entende que as pessoas vão dar risada, ele se
adapta à situação. Isso tem um custo para a saúde mental, porque não é natural,
fica mais cansativo e mais estressante”, explica. Já no grau
moderado, geralmente os autistas falam poucas palavras ou são
não verbais, há a presença da deficiência intelectual ou de algum
comprometimento cognitivo, além de comorbidades neurológicas e síndromes
genéticas associadas.Em relação ao grau severo, a
neuropsicóloga explica que, em regra, são pessoas com deficiência intelectual e
não verbais. Elas também podem apresentar comportamentos disruptivos de
autolesão; de auto e heteroagressividade, como bater no outro e se bater
justamente pela grande dificuldade na comunicação.“Em alguns casos, isso também
está presente no grau moderado, mas vemos essa regra no severo e também
manifestações clínicas importantes, como quadros neurológicos e síndromes
genéticas. Nesses diferentes graus, o que vemos é o impacto na funcionalidade e
o custo disso para a família. Por isso é importante delinear isso, para
pensarmos na inclusão, na escola, no apoio, nas orientações e adaptações”,
ressalta Joana.( Fonte R 7 Noticias Brasil)
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