A lei tem como fundamento o tratamento mais humanizado dos pacientes com doença mental.
A Lei
da Reforma Psiquiátrica no Brasil completou 21 anos neste mês em meio a
conquistas e desafios. Também conhecida como Antimanicomial ou Paulo Delgado, a
lei tem como fundamento o tratamento mais humanizado dos pacientes acometidos
por doenças mentais, com o fechamento gradual de manicômios e hospícios
existentes no País. A diretriz é a internação do paciente somente se o
tratamento fora do hospital se provar ineficiente.Nesses 21 anos de vigência, a
lei conseguiu promover avanços na forma como o Estado, a sociedade e os
próprios profissionais de saúde encaram e tratam os doentes mentais no País.
Mas também enfrentou e enfrenta resistências tanto de ordem cultural na forma
de ver a doença mental, como também de instituições e profissionais que
insistem em velhos métodos, muitos deles considerados cruéis, com o uso de
camisas de força ou choque elétrico, por exemplo.Para o sociólogo e ex-deputado
pelo PT, Paulo Delgado, que foi autor do projeto e, por isso, deu nome à lei,
mesmo após tanto tempo, o texto não precisa de aprimoramento, mas é necessário
que haja mais fiscalização da população e dos parlamentares para garantir a
correta aplicação e regulamentação. “Se os parlamentares brasileiros –
deputados federais, senadores, deputados estaduais e vereadores – se dedicassem
a fiscalizar as portarias e os atos do Poder Executivo, haveria muita condição
de fazer as leis melhorarem. Porque o grande problema do Brasil, às vezes, não
é a lei, mas a aplicação da lei, é a regulamentação, porque a autoridade, ao
regulamentar, às vezes, faz uma lei completamente diferente”, disse Paulo
Delgado.A Lei da Reforma Psiquiátrica prevê que os pacientes sejam tratados em
unidades apropriadas e por equipes multidisciplinares – com psicólogos, médicos
e outros profissionais de saúde – que promovam a reintegração do doente ao
convívio social. Em 2002, o Ministério da Saúde determinou a criação dos
Centros de Apoio Psicossocial (Caps). Outras estruturas foram implementadas ao
longo desses 21 anos, como os serviços residenciais terapêuticos e as unidades
de atendimento.Dificuldades O diretor secretário da Associação
Brasileira de Psiquiatria, Sérgio Tamai, acredita que uma das dificuldades para
que a reforma se consolide de forma definitiva e eficaz é a deficiência ainda
existente na rede de atendimento ao paciente de doença mental, tanto no Sistema
Único de Saúde (SUS) como no sistema privado.“A acessibilidade não é tão fácil
assim. Tanto na rede SUS e mesmo na rede privada, talvez em menor intensidade,
demora-se, muitas vezes, semanas até se conseguir uma consulta. Posteriormente,
tem o problema da continuidade do tratamento também”, declarou Sérgio Tamai. A
coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa
da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial, deputada Erika Kokay (PT-DF),
acredita que há um movimento no governo pelo retrocesso e que é preciso haver
mobilização da sociedade para garantir o avanço da reforma psiquiátrica no
Brasil. “Há muitas ameaças e há muitos retrocessos que estão sendo engendrados
a partir de quem não acredita na liberdade nem aceita a humanidade na sua
fartura que ela deva carregar. Mas há uma resistência por quem passou por
manicômio”, disse a deputada. “Eu lembro da fala do Zé Alves, que é líder do
movimento da saúde mental no Distrito Federal, e ele diz: 'eu fiquei dois anos
no hospício e, em dois anos, eu morri várias vezes'. E ele diz: 'é nenhum passo
atrás, manicômio nunca mais'.” A reforma psiquiátrica no Brasil teve como base
as ideias e práticas do psiquiatra italiano Franco Basaglia, que, na década de
1960, revolucionou as abordagens e terapias no tratamento de pessoas com
transtornos mentais.Crítico da psiquiatria tradicional e da forma como operavam
os hospícios, Basaglia desenvolveu nova abordagem na terapêutica para doenças
mentais, que tinha como objetivo central a reinserção do paciente na
comunidade, em vez do isolamento em manicômios e do tratamento à base de fortes
medicações, vigilância, choques elétricos e camisas de força. Fonte: Agência
Câmara de Notícias Reportagem – Silvério Rios Edição – Pierre Triboli