Uma reportagem especial da Agência Brasil, com base em relatório do
Conselho Nacional de Justiça, revela superpopulação em carceragens goianas,
além de situações de maus tratos
Trabalho do repórter Gilberto Costa,
da Agência Brasil, publicado no último dia 11, quinta-feira, aponta que um
relatório do Conselho do Conselho Nacional de Justiça detectou superlotação em
13 dos 19 estabelecimentos prisionais inspecionados pelo órgão em maio e junho
do ano passado no estado de Goiás, inclusive o Presídio Regional em Anápolis. Em
alguns desses estabelecimentos, a taxa de ocupação era mais do que o dobro da
capacidade prevista, caso da Unidade Regional de São Luís de Montes Belos, na
Unidade Regional de Rio Verde, na Casa de Prisão Provisória de Aparecida de
Goiânia e na Penitenciária “Coronel Odenir Guimarães”. Nessas duas últimas
unidades, a capacidade projetada era para 906 presos, como estabelece o
Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, Entretanto, estavam
confinadas 1.940 pessoas na Casa de Prisão Provisória de Aparecida de Goiânia
e 1.840 na Penitenciária “Coronel Odenir Guimarães”. Na primeira, “em
algumas celas a situação de superlotação era mais agravada. Em um dos espaços
havia 76 pessoas, mas somente 22 colchões”, descreve o relatório. O excesso de
presos contraria normas e princípios. O local se destina, “desde sua
origem, à custódia de presos provisórios, mas, em todos os blocos foi relatada
a presença de pessoas sentenciadas”. Além disso, havia homens e mulheres presos
no complexo, o que é proibido pela Lei de Execução Penal. Na Regional de São
Luís de Montes Belos, a capacidade máxima era para 66, mas havia 149
presos. Na de Rio Verde que deveria comportar, até, 147 pessoas, o CNJ flagrou
299 presos amontoados. Também, havia superlotação nas unidades prisionais
Regional de Anápolis (taxa de ocupação de 196,49%); de Novo Gama
(180,65%); de Alexânia (162,67%); na Penitenciária Feminina Consuelo
Nasser (155,74%); na de Caldas Novas (147,28%); Morrinhos
(147,24%); Mineiros (144,63%); Valparaíso de Goiás (140,48%);
Planaltina de Goiás (136,1%) e Regional Feminina de Israelândia (115,69%). Tortura
e maus tratos O CNJ, também, verificou “diversos indícios de tortura e maus-tratos.”
O relatório trouxe fotos de “pessoas com feridas visíveis, hematomas e marcas
de munição de elastômero (balas de borracha)”. Segundo o documento, “foram
uníssonos os relatos de existência de ‘castigos’ e sanções com o emprego de
violência, tortura, maus-tratos e outros tratamentos cruéis e degradantes, além
da privação de direitos”. “Denúncias recebidas em todos os estabelecimentos
prisionais apontam para alarmantes episódios de tortura, com supostas práticas
como eletrochoque, afogamento, sufocamento, desmaio, golpes em genitálias,
tapas e, até mesmo, empalamento”, completa o documento. Um dos exemplos das
torturas sofridas pelos presos é destacado na Unidade Prisional Especial de
Planaltina de Goiás, no entorno do Distrito Federal. A inspeção do CNJ tomou
conhecimento de “muitos informes” de que “haveria um espaço denominado
‘galpão’, onde ocorreriam supostas práticas de tortura e maus-tratos”. A equipe
da visita verificou que, no local, foram instaladas câmeras recentemente.
“Contudo, somente e especificamente nesse espaço, observou-se que os
equipamentos não estavam programados para arquivarem imagens”. O relatório
assinala a dificuldade dos presos de denunciarem as condições a que estão
submetidos. “Inspira especial preocupação a fragilidade dos fluxos internos
para recebimento e investigação de denúncias de tortura, maus-tratos e outros
tratamentos cruéis, desumanos e degradantes. A ausência de contato com o mundo
exterior e a falta ou insuficiência de assistência jurídica agravam o quadro de
incomunicabilidade e silenciamento de eventuais violações à integridade física
e psicológica das pessoas privadas de liberdade nos estabelecimentos
prisionais”. Outros problemas O CNJ ressalta que
os bloqueios de comunicação também são de fora para dentro dos presídios.
“Cumpre destacar, ainda, que foram comuns os relatos de impedimento de acesso
por órgãos de controle social vinculados à Política Nacional de Direitos
Humanos e ao Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, bem como por
instituições da sociedade civil, que cumprem papel fundamental no controle
externo dos estabelecimentos prisionais, devendo ser respeitadas e
fortalecidas. O cenário constatado parece, ao contrário, ser de criminalização
desses órgãos”. Além da superlotação e das denúncias de tortura, o relatório
registra a “indisponibilidade de água potável” em alguns presídios. Na Unidade
Prisional Regional de Morrinhos, por exemplo, a água potável era
disponibilizada, somente, durante o almoço e o jantar. Havia problemas com
fornecimento regular e suficiente de insumos básicos de higiene, limpeza e de
vestimentas. O relatório alerta para o fornecimento de “alimentação em
quantidade e qualidade inadequadas”. O documento ressalta que a vistoria
localizou pessoas presas “sem acesso à saúde integral”, sofrendo “agravos em
saúde ocasionados pelas condições de encarceramento” e vivenciando
“episódios recorrentes de desassistência”. Na Casa de Prisão Provisória de Aparecida
de Goiânia, a equipe do CNJ ouviu “relato de aborto sofrido dentro da unidade,
de mulher que indicou estar grávida há três meses, mas o teste só foi feito
após o aborto, não tendo sido realizado mais nenhum procedimento, embora esteja
sentindo dor e com sangramento, prática está em total violação a diretrizes de
saúde materno-infantil do Ministério da Saúde.” Histórico A missão do CNJ em
Goiás foi realizada entre os dias 29 de maio e 2 de junho de 2023, coordenada
pelo corregedor nacional de Justiça, ministro Luís Felipe Salomão e pelo
desembargador Mauro Pereira Martins, então conselheiro supervisor do
Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema
de Execução de Medidas Socioeducativas. A ex-ministra Rosa Weber, então
presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ, acompanhou a missão. O
relatório é resultado do trabalho de força-tarefa de correição extraordinária
formada por 22 magistrados e 27 servidores do CNJ. A equipe percorreu 20%
dos presídios do Estado de Goiás, em oito cidades: Anápolis, Aparecida de
Goiânia, Mineiros, Rio Verde, Águas Lindas, Novo Gama, Planaltina de Goiás e
Valparaíso – as quatro últimas no Entorno do DF. À época, Goiás tinha a oitava
maior população prisional no Brasil, com 21 mil pessoas em privação de
liberdade em 88 estabelecimentos. Conforme o CNJ, 73,69% das pessoas privadas
de liberdade eram negras (pretas e pardas). Havia 298 pessoas presas para cada
100 mil habitantes. A Agência Brasil afirma haver entrado em contato,
por telefone, e e-mail com a assessoria de imprensa do governo de
Goiás para pedir uma manifestação a respeito do relatório, mas, não obteve
retorno.( Fonte Jornal Contexto Noticias GO)