Biden classifica como genocídio
matança armênia pelos turcos em 1915.
Império Otomano foi responsável por cerca de 1,5
milhão de mortes durante perseguição, que durou até 1923.
O
presidente norte-americano Joe Biden reconheceu neste
sábado (24) que houve genocídio na Armênia em 1915, perpetrado pelos turcos. A
data marca o dia da memória dos massacres em série, que ceifaram a vida de 1,5
milhão de armênios no contexto da dissolução do Império Otomano e da Primeira
Guerra Mundial (1914-1918). A informação de que Biden classificaria as atrocidades cometidas
à época como genocídio, ou seja, como uma política deliberada de extermínio da
população armênia, foi antecipada nesta quarta (21) pelo jornal “The New York
Times“. A declaração foi uma promessa de campanha do democrata
durante a corrida presidencial de 2020 e resgata o uso do termo pela primeira
vez em 40 anos – o último a usá-lo foi Ronald Reagan, em 1981. O reconhecimento
vem na esteira de uma carta bipartidária,
assinada por senadores de matizes ideológicos antagônicos que vão de Bernie
Sanders, democrata do estado de Vermont, a Marco Rubio, republicano da Flórida.
“Escrevemos hoje para pedir a você que reconheça oficialmente a verdade do
Genocídio Armênio”, diz a correspondência, de 19 de março. Entre os 29 países que
reconhecem a política de perseguição dos otomanos estão Argentina, Brasil,
Alemanha, Itália, Rússia, Síria, Suíça e Uruguai. Identidade e
diáspora A admissão do genocídio é um dos pilares
da política externa da Armênia contemporânea, observa o historiador Heitor
Loureiro, pesquisador associado do Gepom (Grupo de Pesquisa e Estudos sobre o
Oriente Médio). “As relações entre
[a Armênia e Turquia] ficaram suspensas por décadas, enquanto a Armênia foi
parte da União Soviética. Em 1991, os dois países restabeleceram relações,
congeladas de novo em 1993, quando a Turquia fechou suas fronteiras com a
Armênia em solidariedade ao Azerbaijão na Guerra de Nagorno-Karabakh”, explica
Loureiro, que estudou o genocídio em seu doutorado pela Unesp (Universidade
Estadual Paulista). O chanceler armênio, Ara Aivazian, saudou a possibilidade
de reconhecimento como
“uma baliza moral para muitos países”. “Não é uma questão de Armênia e Turquia,
mas uma obrigação de se reconhecer e condenar genocídios passados, presentes e
futuros”, afirmou. Para seu contraparte turco, Mevlut Cavusoglu, “se os EUA
querem danificar as relações [com a Turquia], a decisão é deles”. Os EUA
abrigam uma bem articulada comunidade armênia na
Califórnia, cujos nomes mais proeminentes defendem o reconhecimento oficial do
genocídio. Entre as celebridades norte-americanas que já falaram publicamente
sobre o assunto estão a empresária Kim Kardashian, a cantora Cher – cujo nome
de batismo é Cherilyn Sarkisian – e o músico Serj Tankian, vocalista da banda
System of a Down. “Na diáspora, o genocídio ganhou um espaço muito importante
como traço fundador de uma ‘identidade
armênia‘ e de algo que conecta armênios em todo o mundo em torno de
um ‘ser armênio’, que passa pela rememoração do genocídio e pela luta por
reconhecimento”, afirma o pesquisador. O genocídio A partir de 1915, o Império Otomano impôs uma política de
violência e deportação forçada de armênios étnicos que viviam
na porção leste da Anatólia, península que abriga a atual Turquia. Ali, a
população era composta em sua maioria por muçulmanos curdos e cristãos
armênios, ambos de identidade pouco identificada com os turcos. No início da I
Guerra, eram 2,5 milhões de armênios otomanos, concentrados em cidades de
maioria da mesma etnia. Também havia grupos além das fronteiras imperiais, já
em território controlado
pela Rússia. A partir do século 19, o grupo passa a ser visto pelo governo como
um possível foco de separatismo e instabilidade dentro do império.
Entre 1894 e 1896, ocorrem os primeiros massacres. Naquele contexto, o grupo
denominado “Jovens Turcos” dominava a política otomana que marcou os últimos
anos de decadência do império – dissolvido após o fim da I Guerra, em 1923. Em
24 de abril de 1915, o governo ordena a prisão de 250 intelectuais e políticos
armênios em Istambul,
ocasião que marca o início do genocídio. Até 1923, os armênios foram
considerados ameaça à
segurança nacional e deportados para as regiões mais
afastadas e desérticas do Império, na atual Síria. Os poucos que sobreviviam à
jornada eram abrigados em campos de concentração. Estimativas conservadoras
põem na faixa de 600 mil a um milhão de armênios mortos apenas em decorrência
das políticas de expulsão. As terras e propriedades armênias foram ocupadas por turcos e
outros refugiados muçulmanos, e quem permaneceu foi forçado a se converter ao
Islã. À época, jornais ocidentais reportavam o que ocorria nas franjas do
Império Otomano. O norte-americano “The New York Times” já manchetava em julho de 1915 “massacre
no atacado” e, em novembro de 1916,
uma declaração do coronel do Exército otomano Halil Bey sobre um plano turco
para “exterminar a raça armênia”. O diário
nova-iorquino já classificava então os massacres dos armênios
como “organizados pelo governo” e “sistemáticos”. Essa também foi a constatação
de Henry Morgenthau Sr, embaixador dos EUA no Império Otomano: “uma campanha de
extermínio da raça”, afirmou. O resultado foi que, em 1922, restavam apenas 387
mil armênios dentro das fronteiras imperiais, segundo levantamento do Centro de
Estudos de Genocídio e Holocausto da Universidade de Minnesota (EUA). “As
causas para o genocídio são variadas, mas passam por entender a ascensão do
nacionalismo turco e a eliminação dos
elementos não turcos do Império e o reassentamento de populações muçulmanas em
áreas antes habitadas por armênios”, observa Loureiro. “A presença de armênios
em Impérios vizinhos, o russo e o persa, serviu como desculpa para o governo
otomano legitimar os morticínios, tendo como pretexto a presença de armênios em
batalhões russos que lutavam contra o Império Otomano no Cáucaso.” O genocídio
jamais foi reconhecido pela
Turquia, que admite amplas violações durante o período, mas afirma que não
houve uma política sistemática de Estado. Apenas em 2014 o governo de Ancara
ofereceu condolências formais ao povo armênio.( Fonte A Referencia Noticias
Internacional)