Com
mais de 200 anos de história, o setor é mais antigo que a própria capital e já
foi seu mais importante polo comercial, mas hoje enfrenta inúmeros problemas.
Conhecido por ser um bairro mais antigo que a própria capital, o
Setor Campinas é um dos mais tradicionais de Goiânia. Décadas atrás, a região,
que tem mais de 200 anos, foi um dos principais polos comerciais da cidade,
além de ser repleta de edificações no estilo art déco, que influenciou a
capital nas décadas de 1930 e 1940. Por conta de prédios como o Goiânia Palace
e o Antigo Fórum e Tribunal de Justiça, o bairro foi tombado pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) como patrimônio histórico e
cultural. Ou seja, além de ser um dos bairros mais importantes economicamente
de Goiânia, o local possui grande relevância para a arquitetura da cidade. Entretanto,
a situação do Setor Campinas se degradou nos últimos anos e o bairro tem
perdido seu “encanto”. O comércio, que antes era pulsante, agora dá lugar ao
abandono e à criminalidade. Ao mesmo tempo, o setor enfrenta um problema
crônico de gentrificação, com inúmeros moradores de rua circulando pelas vias. Aos
75 anos, Paulo Magalhães (UB), vereador de Goiânia por quatro mandatos e o mais
jovem eleito da história da capital, relembra Campinas com nostalgia. Ele conta
ao Jornal Opção que
trabalhou por muitos anos distribuindo jornais e como engraxate. “Eu conheci a Avenida 24 de Outubro sem
asfalto”, relembrou Magalhães. “Trabalhei na Avenida Catalão, esquina com a Rua
do Comércio, com o ‘Nenê’, que era o distribuidor de jornal. Às quatro e meia,
cinco horas da manhã, eu já estava lá para pegar minha pastinha e vender
jornal. Foi ali que tirei minha primeira foto, no fundo do campo do
Atlético-Go, na Catalão, onde também comprei minha primeira calça nas Casas
Riachuelo, esquina da Rua 500 com a Catalão. Também engraxava sapato na Avenida
Bahia, com a Pernambuco, e as prostitutas me pagavam para engraxar os sapatos,
além de pedir para que eu encerasse o quarto delas. Às vezes, levava a roupa
delas para minha mãe lavar e elas pagavam direitinho”, acrescentou.
Magalhães conta que morou por muitos anos na Rua 29, no bairro Fama, mas que
trabalhava no bairro vizinho. Ele também compartilhou histórias de momentos
divertidos que viveu no bairro. “Foi uma vida difícil, mas sempre com boas
lembranças de Campinas”, pontou. “Vivi
muita história em Campinas, eu ia ao cinema Eldorado assistir à matinê, e lá,
tinha que entrar de paletó ou blusa de frio. Uma vez eu menti para a minha mãe
dizendo que ia ao horto, mas antes do ônibus parar, eu pulei e, caí na
enxurrada de ‘prancha’ e cheguei em casa com a calça toda suja. Minha mãe lavou
a calça e a secou no ferro para eu poder sair novamente. Eu conhecia o
Atlético-Go, onde havia respeito pela cor, com um tambor batendo em volta do
estádio Antônio Accioly, e quando passava em frente à torcida do Vila Nova,
gritavam: ‘respeite a cor, seus vagabundos’”, narrou o político. Entretanto, Magalhães relembra
com tristeza que o setor atualmente está com problemas. “Antigamente tinha um
comércio forte, com as feiras Hippie e da Madrugada, mas está abandonada.
Campinas nunca deixou de ser Campinas, mas está abandonada por falta de
respeito da administração municipal”, alerta. Pedido de socorro Morador de Campinas há quase 60
anos, Helincon Faria Rodrigues Júnior conta que o pai teve a primeira farmácia
do bairro e que a situação atual não está boa na região. “A Prefeitura de
Goiânia se esqueceu do setor e estamos tristes com a situação aqui. Nós pedimos
socorro, temos acúmulo de lixo, lâmpadas queimadas, árvores precisando de poda
e ruas cheias de buracos”, relatou o residente. Já o autônomo Cláudio Marmo,
que mora na região há 46 anos, acrescenta que o bairro enfrenta grandes
problemas. Uma das questões envolve os pontos de reciclagem do setor, que se tornaram
um ponto para os usuários de drogas. Algo que contribuiu para que o bairro se
torne um local de concentração de moradores de rua. “A insegurança é um dos
maiores problemas, porque as idosas, por exemplo, não conseguem ir à igreja ou
ao mercado com segurança, tudo ficou muito complicado. O problema dos pontos de
reciclagem, que se tornaram locais para o uso de crack, faz com que ocorram
furtos e roubos a residências e comércios durante a noite para sustentar o
vício, o que acaba depreciando ainda mais a região”, cita o morador. O
empresário Paulo César Pereira, que vive no local há quatro décadas, não poupou
críticas ao atual prefeito Rogério Cruz (SD). “Estamos totalmente abandonados
pelo poder público nesta gestão pífia do senhor Rogério Cruz. Ruas sem
iluminação e esburacadas, trânsito caótico e sem fiscalização, além de uma
coleta de lixo feita sem planejamento e sem cronograma. É um total desleixo e
descaso do poder público com um bairro que é o maior gerador de receita para o
município”, critica. O residente também alerta que o local enfrenta “problemas
crônicos” em várias áreas. “Campinas deixou de ser um bairro aprazível e
familiar. Temos problemas crônicos com o trânsito, a mobilidade e,
principalmente, com os moradores em situação de rua, que vagam pelo bairro,
cometem furtos e roubos, além de amedrontar e cercear o direito das pessoas
circularem livremente pelo bairro, principalmente à noite” relata. Faísca de esperança Apesar dos problemas
relacionados à segurança serem inúmeros, alguns moradores relataram que houve
melhorias nesse quesito no bairro. Segundo o líder comunitário Diego Gutierrez,
a situação está melhorando, e ele também tem esperança de que o bairro comece a
se reerguer. “A situação está melhorando, mesmo que de forma gradual. Quando o
38º Batalhão entrou em ação, com o Coronel Paulo, começaram as melhorias,
especialmente em relação à segurança pública. O bairro começou a se reerguer,
em termos de segurança, o setor melhorou um pouco. Claro que ainda há pontos a
serem melhorados, mas já vemos um progresso”, argumentou o representante do
setor. Gutierrez também menciona que o número de moradores de rua está
diminuindo, mas aponta que existem áreas na região que ainda precisam de maior
apoio. Entre os locais com maior concentração de pessoas que necessitam de
acolhimento estão às redondezas do Ginásio Campinas e a Praça Joaquim Lúcio. Anteriormente,
o Jornal Opção publicou a denúncia de moradores da
região sobre as praças Joaquim Lúcio e da Matriz, que se tornaram
“cracolândias”. Com o abandono por parte do poder público e assaltos, tanto de
dia quanto à noite, os moradores descrevem uma situação de violência e tráfico
de drogas, mencionando até assassinatos relacionados ao comércio ilegal.
Diversos dependentes de álcool e drogas, além de traficantes, circulam pela
região. Ações para Campinas
Para a arquiteta e professora da Pontifícia Católica de Goiás (PUC-GO), Maria
Ester de Souza, o bairro é perfeito para receber um projeto de revitalização.
Ela cita que a região é um “presente para qualquer urbanista” por conta de suas
características. Por isso, a especialista não vê problemas para recuperar o
bairro. “Campinas é como se fosse um presente para qualquer urbanista que
queira fazer uma revitalização. O bairro tem ruas estreitas, com comércio de
rua, aquilo que sempre ouvimos dos empresários ‘vamos promover as fachadas
ativas’, que é você andar na calçada e entrar na loja. No entanto, por parte do
governo, não vemos nenhuma proposta mínima de saneamento do lugar”, explica a
docente da PUC-GO. Segundo Maria Ester, toda a infraestrutura necessária já
está presente no local, incluindo calçadas, asfalto, postes e até drenagem,
embora precária. Com o comércio e os serviços já instalados, apenas alguns
ajustes seriam necessários para melhorar o bairro. “Portanto, um projeto
simples de saneamento em Campinas poderia transformar o bairro em um ‘shopping
a céu aberto’, o que seria incrível”, destaca. Iniciativas Apesar de não ter sido reeleito
nas eleições deste ano, Paulo Magalhães prometeu que, caso retorne à Câmara
Municipal de Goiânia, destinará mais emendas para o bairro. Ao mesmo tempo, os
vereadores Lucas Kitão (UB) e Kátia Maria (PT) também estão com projetos em andamento
para a região. Por exemplo, Kitão sobre a necessidade de revitalização,
destacando a importância do bairro para Goiânia, tanto cultural quanto
comercialmente. Em uma de suas propostas, ele defende a criação de ecopontos
para resolver os problemas da reciclagem irregular. Além de polo de reciclagem
perto do aterro sanitário, onde as cooperativas poderiam fazer a triagem
adequada dos materiais. “O objetivo é destinar os materiais recicláveis para as
cooperativas sérias, que gerariam empregos e condições de trabalho dignas.
Lembrando que os irregulares, aqueles que não respeitam os direitos humanos,
acabam sustentando essa situação crítica e exploram os dependentes químicos”,
explica o vereador do União Brasil. Kitão também defende mais investimentos em infraestrutura,
incluindo a saúde, além redução de impostos, como Imposto Sobre Serviços (ISS)
e o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), junto com o projeto de
revitalização. Assim como é o Plano de Requalificação do Centro de Goiânia, o
“Centraliza”, que está em trâmite no Legislativo goianiense. Já Kátia discute
suas ideias para revitalizar o bairro e cita o projeto “Viva Campinas”, uma de
suas iniciativas. A ideia do projeto é requalificar, ocupar e fomentar o
comércio, além de discutir a função social do bairro. A matéria é estruturada
em cinco eixos: Patrimônio material e imaterial; economia, arte, cultura e
lazer; mobilidade e sustentabilidade; além de segurança e dignidade humana; e
trabalho e emprego. A vereadora defende que é necessário olhar para Campinas
com uma perspectiva renovada, com foco na preservação e valorização de seu
patrimônio histórico. Por isso, o Viva Campinas busca trazer essa visibilidade.
“Isso despertou interesse de outros políticos, incluindo da Prefeitura, com o Centraliza,
já que também temos uma iniciativa semelhante para o Centro de Goiânia”, conta.
O Viva Campinas pretende espalhar diversas atividades pelo bairro em suas
edições, com uma programação cultura voltada para movimentar a região.(Fonte
Jornal Opção Noticias GO)