ARTIGO: Caravanas de migrantes, o
fim da crise ou a crise sem fim?.
Pesquisador debate as origens, a
contenção e o futuro das caravanas de migrantes vindos da América Central para
os EUA.
Em
15 de janeiro, a mais recente das chamadas “caravanas”, êxodos, ou longas marchas
para os Estados Unidos que tinham como objetivo chegar ao seu
destino no contexto da inauguração do governo de Joseph Biden, começou sua
jornada. Cerca de mil hondurenhos iniciaram a viagem e entraram em território
guatemalteco. Entretanto, a caravana foi
violentamente contida pelas forças de segurança do país, sob o
argumento de irregularidades migratórias e razões sanitárias. Embora alguns
tenham conseguido chegar ao seu destino, a maioria dos membros da caravana teve
que retornar ao seu país de origem. Após este último episódio, em 1º de março,
os presidentes Joseph Biden e Andrés Manuel López Obrador realizaram uma
reunião virtual. Após abordar questões bilaterais, como a evolução do T-MEC, ou
a gestão da pandemia na região fronteiriça, os líderes discutiram a delicada
questão dos fluxos migratórios mistos nos últimos anos, especialmente do
território hondurenho. As caravanas são verdadeiros êxodos de
famílias inteiras, crianças e
adolescentes desacompanhados, desempregados, refugiados ambientais,
pessoas LGBT, pessoas com deficiência e migrantes de outros países do
continente e do mundo.
A origem das caravanas As
caravanas ou êxodos em massa dos centro-americanos com destino aos Estados
Unidos se tornaram mais visíveis a partir de outubro de 2018. A primeira caravana,
convocada anonimamente nas redes sociais, saiu da cidade
hondurenha de San Pedro Sula e foi posteriormente aumentando
com migrantes procedentes de outros países centro-americanos, caribenhos e
outras nacionalidades. A caravana surgiu como uma estratégia migratória
inovadora que buscava, através de uma ação coletiva, alguma proteção e
segurança para seus membros durante a longa marcha através do território
guatemalteco e mexicano em direção a um incerto “sonho americano”. Da
perspectiva dos países que enviam migrantes, as caravanas têm sido – e
continuam sendo – provocadas por causas estruturais como injustiças sociais,
exclusão, desemprego e subemprego, violência, patriarcado e criminalidade.
Também por causas conjunturais como os efeitos
socioeconômicos e sanitários provocados pela pandemia da
covid-19 e fenômenos climáticos extremos como os furacões Eta e Iota que
devastaram os países da América Central em novembro de 2020. Vínculos entre
corrupção excessiva e emigração No
caso de Honduras – o principal país emissor de caravanas, ou êxodos –, é
necessário acrescentar o colapso institucional e a grave deterioração da
qualidade da democracia gerada por numerosos casos de corrupção, captura do
aparato estatal e até mesmo atos ilícitos
transnacionais cometidos por funcionários do governo do
presidente Juan Orlando Hernández. Efetivamente, existe um vínculo entre o
excesso de corrupção e a emigração massiva de hondurenhos. Recentemente, um
relatório do Conselho Nacional Anticorrupção de Honduras afirmou que “a
corrupção causa migração entre os hondurenhos à medida em que passa o tempo,
perdendo principalmente os acessos aos serviços públicos que foram reduzidos e
até mesmo roubados do povo”.Além disso, a falta de empregos faz com que a visão
das pessoas “se posicione em relação a outras nações, cujo padrão de vida e
qualidade de vida são elevados e alcançáveis, mesmo quando migram de forma
irregular e sob circunstâncias de alto risco”. Coincidências
entre Biden e AMLO Neste contexto
de crises migratórias e humanitárias macrorregional, a convergência pelo menos
retórica entre Biden e AMLO é uma boa notícia. Segundo a declaração conjunta
publicada a partir do referido encontro presidencial, as partes propuseram
“discutir mecanismos de cooperação sobre migração e avançar nos esforços
conjuntos para promover o desenvolvimento no sul do México e
no Triângulo Norte da América Central”. A declaração também reconhece as
contribuições dos migrantes para os diferentes países de origem, trânsito e de
destino, e os mandatários teriam se comprometido “a promover políticas
migratórias que reconheçam a dignidade dos migrantes, bem como o imperativo de
uma migração ordenada, segura e regular”. Os mandatários concordaram ainda em
“colaborar em um esforço conjunto para abordar as causas profundas por trás da
migração regional, melhorar a gestão e desenvolver vias legais para a
migração”. Em tal esforço bilateral e multilateral, os governos de ambos os
países, juntamente com seus homólogos centro-americanos, bem como atores da
sociedade civil e do empresariado, poderiam promover o desenvolvimento
econômico, combater a corrupção e cooperar na aplicação da lei. Da perspectiva
da defesa dos interesses nacionais de ambos os países, bem como de
considerações humanitárias, este passo à frente dos governos Biden e AMLO
poderia ser apoiado por outros atores sociais, políticos, econômicos,
ambientais e acadêmicos com laços e interesses na temática. A formulação e
implementação de políticas públicas que promovam o desenvolvimento social e
ambiental, e que elevam a qualidade da democracia no sul do México e na América
Central, são verdadeiramente urgentes, necessárias e pertinentes. A busca de
novos horizontes As pessoas,
famílias ou coletividades decidem deixar seu país e empreender uma jornada
arriscada, perigosa e incerta somente quando chegam à infeliz conclusão de que
não serão capazes de realizar seus projetos e sonhos em seu próprio país. Isto
se torna um poderoso incentivo para buscar novos horizontes no exterior. E
embora a migração – especialmente o refúgio –
seja uma alternativa e até mesmo um direito, certamente o êxodo maciço de
recursos humanos acaba sendo uma hemorragia virtual da força de trabalho para
os países de origem. Além de ser um desafio político-administrativo,
trabalhista e social para os países de trânsito e de destino. Há uma
oportunidade de reiniciar um diálogo político-diplomático e social mais eficaz,
construtivo e solidário entre os Estados Unidos, o México e a América Central.
O diálogo tripartite do processo de Puebla, conhecido como Conferência Regional
sobre Migração, foi praticamente abandonado durante a administração de Donald
Trump. A reativação deste mecanismo de consulta e coordenação certamente
poderia contribuir para desativar a atual crise humanitária representada pelas
caravanas dos últimos três anos. Somente políticas públicas reformistas,
abrangentes e fraternais podem resolver definitivamente o problema.( Fonte A
Referencia Noticias Internacional)