Modelo atende nova demanda do setor, mas associações reclamam de impacto
nos bairros e entregadores reivindicam direitos básicos.
Envoltas em polêmicas sobre regulamentação, as "cozinhas fantasmas", conhecidas como "dark kitches", se tornaram alvos constantes de reclamações de moradores dos bairros que as abrigam e de entregadores que prestam serviço ao modelo de negócios durante a pandemia. Uma parte da população defende que esses espaços não precisam de regras próprias porque já estão de acordo com o Plano Estratégico Diretor da cidade enquanto outro grupo acredita que as cozinhas precisam de regramentos em função do impacto que provocam nos entornos.Um pouco antes do início da pandemia de Covid-19, em março de 2020, as dark kitchens, também conhecidas como “cloud kitchens" começaram a se popularizar. Na cidade de São Paulo, o serviço se tornou uma opção viável até mesmo para grandes e reconhecidos restaurantes, que precisaram se adaptar ao modelo de entrega para operar em meio à crise econômica. A Kitchen Central, uma das principais empresas do ramo em São Paulo, possui unidades de galpões com mais de 30 cozinhas em vários bairros da capital paulista, como Butantã, Mooca, Vila Mariana, Santo Amaro, Lapa e Brooklin. Por um lado, esses espaços inovam e atendem uma nova demanda do setor alimentício após pandemia. Por outro, muitas cozinhas oferecem ambientes de precarização aos trabalhadores e, a falta de regulamentação atrapalha a rotina de moradores das regiões. Com isso, associações de bairro se organizaram para tirá-las das vizinhanças, e entregadores reivindicam o direito de ter lugares apropriados para usar um banheiro.Segundo o presidente do Sehal (Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do Grande ABC), Beto Moreira, as dark kitchens são um subproduto da pandemia. Para ele, o principal cuidado é a localização: “O empresário que resolve investir nesse modelo de negócio precisa considerar que há casas em volta”. O poder executivo enviou, em junho desse ano, à Câmara Municipal de São Paulo um projeto de lei que regulamenta a atividade na cidade. Agora, o conjunto de regras é discutido em audiências públicas e aguarda aprovação em primeira votação. Vizinhanças bPara o modelo de entrega funcionar, os restaurantes precisam estar perto dos consumidores, ou seja, nos bairros. Essa condição, porém, de acordo com associações, é um problema. Paula Bonifácio, membro da Associação de Moradores Amigos do Panamby, afirma que a questão é cumulativa, porque são diversos restaurantes em um lugar só. “Eles agregam dezenas de estabelecimentos em um mesmo prédio e com isso a escala é industrial. Quando falamos de indústria, temos regulamentações, regras e zoneamento específicos para funcionar”, afirma ela, que também é empresária do ramo industrial.Ao R7, Paula disse que a obra ao lado de seu apartamento começou há oito meses, mas os moradores se mobilizaram rapidamente e conseguiram a paralisação após um pedido da Subprefeitura do Campo Limpo. Essa interrupção, porém, foi revertida em março de 2022 e logo voltaram a construir. Durante audiência pública na Câmara Municipal de São Paulo, em 9 de junho, moradores expuseram queixas. Marcelo Torres, membro da Associação Viva Paraíso, afirmou que "cozinhas industriais estão se instalando em lugares incompatíveis, trazendo transtornos aos vizinhos.O advogado Roberto Delmanto Júnior, que representou algumas entidades paulistanas durante a audiência, disse que há empreendimentos na capital paulista com mais de 30 cozinhas. Isso, segundo ele, representa riscos de acidente. Bonifácio, da associação do Panamby, ressalta que o que mais a preocupa é o risco de uma explosão. “Cozinhas industriais tem elevadíssimo potencial à explosão por causa da combinação de gorduras inflamáveis e partículas da confecção dos alimentos. Isso está bem detalhado em um dos três laudos técnicos que nós temos”, afirma ela. O gerente geral da Kitchen Central, Jorge Pilo, defende que o Plano Diretor da cidade prevê que todos os serviços devem estar a cerca de 15 minutos de distância de qualquer cidadão. Por isso, segundo ele, as dark kitchens precisam ficar perto de casas e prédios. “A lei de São Paulo determina o que pode ser feito em cada lugar e o impacto de terceiros, baseado nisso a gente escolhe nossos locais”, diz o Pilo, nascido na Venezuela, e trabalha há três anos na área. Além disso, ele garante que a empresa está aberta a novos investimentos, mas afirma que se "sente incomodado" com a obrigatoriedade da regularização. "Se fosse assim não teríamos nada numa cidade além de casas", diz "Somos membros da comunidade e entendemos que existem reclamações e estamos escutando elas. O importante é que a gente tenha uma conversa objetiva e técnica”. Entregadores Outra categoria que reúne muitas reclamações sobre o funcionamento das "dark kitchens" são os entregadores. Assim como os restaurantes, os serviços de entrega via aplicativo aumentaram muito com a pandemia.“Lugares que tem essas cozinhas compensam mais do que ficar próximo até de shoppings, que tem muitos restaurantes e as pessoas entram para comer. Lá [nas dark kitchens] não, é só delivery e retirada, aí acaba tocando bem mais entregas”, afirma um entregador de 28 anos, que preferiu não ser identificado.O jovem costuma entregar na rua Borba Gato, na região de Santo Amaro, zona sul de São Paulo, em uma das unidades da Kitchen Central. No local, ele relata que somente depois de muita briga e protestos dos entregadores que colocaram áreas adequadas para a classe esperar pelas entregas. “Muitos reclamando, não conseguindo nem retirar o pedido. Isso daí é um descaso. Sem os entregadores eles não vão gerar as entregas, uma coisa colabora com a outra”, afirma. Em relação a isso, Jorge Pilo afirma que a Kitchen Central faz o acolhimento dos motoboys e garante que todas as unidades tenham espaços adequados para os trabalhadores aguardarem pelas entregas.“A gente está sempre visando melhorar as nossas unidades e nossos serviços para os restaurantes e para o entregador, que nem está prestando serviço para mim, ele está prestando serviço para o aplicativo que presta serviço para o meu cliente, mas entendemos que é importante e fazemos as mudanças necessárias”, conclui Jorge Pilo. ( Fonte R 7 Noticias Brasil)*Estagiária do R7, sob supervisão de Fabíola Perez e Márcio Pinho