ARTIGO: China-Taiwan, ‘dois
Estados’ e o ‘alinhamento automático’ com Pequim
Embaixador analisa o histórico entre as duas nações desde a revolução
chinesa, em 1949, e o futuro da ilha independente.
”. Dessa forma, várias
autoridades locais haviam reiterado que “não existe alteração na política de
governo quanto à promoção do diálogo através do estreito, na implementação de
acordos bilaterais e na busca de uma nova China, unificada sob a democracia, a
liberdade e a prosperidade, no futuro”. Os defensores de Lee continuavam
esclarecendo que “nas cinco décadas, desde o estabelecimento da República
Popular, em 1949, a China tem permanecido dividida pelo Estreito de Taiwan e
governada por dois Estados soberanos”. As observações de Lee, quanto à
existência de um relacionamento especial entre Estados, portanto, tinham —
sempre de acordo com seus seguidores — os significados seguintes: “origens
culturais e étnicas comuns garantem afinidade única entre os dois lados; as
intensas trocas comerciais e entre as sociedades civis e diferentes setores não
podem ser comparadas com o intercâmbio entre quaisquer outros países divididos;
e, o mais importante, as duas partes perseguem o objetivo de uma China unida no
futuro, através de negociações em bases iguais”. Tais desenvolvimentos e a
explicação de que “uma China” seria condição futura, como não poderia deixar de
ser, aumentaram, cada vez mais, as desconfianças chinesas com respeito a Lee
Teng-hui. Nesse sentido, reformas constitucionais feitas recentemente e
propostas para a ilha eram vistas, crescentemente, sob a perspectiva de que
conduziriam à independência formosina. Assim, verificava-se que, a partir do
início da década de 1990, Lee vinha promovendo reformas à constituição de
primeiro de janeiro de 1947, promulgada pelo Kuomintang, quando a República da
China existia em Pequim. Nesse processo, em 1991, foram efetuadas “revisions of
the constitution in procedures”, em 1992, “revisions of the constitution in
substance”, em 1994, foi estabelecida a eleição direta presidencial, em 1997,
foram adotados novos processos legislativos, em 1999 e 2000, regulamentava-se a
Assembleia Nacional. Todas essas iniciativas foram realizadas sob o pretexto de
introduzir medidas que proporcionassem a “democracia”. Ficava cada vez mais
claro, no entanto, que o real propósito de Lee Teng-hui era o de alterar
dispositivo que proíbe seja submetido à consulta popular a questão da
soberania. Isto é, a constituição revista viria a permitir que a população da
ilha pudesse decidir sobre a independência. Nesse caso, Taiwan poderia buscar a
proteção externa a sua independência através da assinatura de tratados
militares com potências estrangeiras. Dessa forma, poderia ressurgir o Tratado
de Defesa entre Taiwan e os Estados Unidos. A reação internacional fria —
gélida, no caso dos países mais próximos, que poderiam ser atingidos por
eventual retaliação militar chinesa — contribuiu para que a crise fosse
superada, em seus efeitos imediatos. Nova cena de partida fora criada, no
entanto, para a questão taiwanesa, uma vez que a moldura de “ambiguidade
criativa”, que permitira as duas partes do estreito a conviver pacificamente,
durante os cinquenta anos anteriores, fora abalada. Conforme mencionado acima,
contudo, a renovada tensão atual através do estreito tem criado maiores
simpatias para a margem taiwanesa. Estudiosos sobre o assunto chegam a
revisitar, por exemplo, a participação da República da China, sob a chefia de
Chiang Kai-shek, na Conferência do Cairo, no final de novembro e início de
dezembro de 1943, durante a Segunda Guerra Mundial. O então Presidente chinês
compareceu ao evento que incluiu os “Quatro Grandes” — o Presidente Roosevelt,
o Primeiro-Ministro Winston Churchill, o líder soviético Joseph Stalin e o
próprio Chiang Kai-shek. Na ocasião, entre outros assuntos, ficou decidido,
como se sabe, que, ao término do conflito, o Japão devolveria à República da
China, as ilhas de Taiwan e a dos Pescadores e o território da Manchúria. No
final da “Guerra do Pacífico”, foi o que aconteceu. Daí — procuram argumentar
os defensores dos independentistas de Taipé — haveria apenas argumentos
políticos e, não “legais”, pois, ao transferir-se para Taipé, em 1949, Chiang
teria levado consigo a “República da China”, quando Mao declarou fundada a
República Popular da China.Cabe lembrar que, em 1999, quando Lee efetuou seu
pronunciamento sobre “um Governo em cada margem do estreito”, viviam-se ainda
lembranças poéticas da fase pós-maoísta, que sucedera período caótico do
governo do “grande timoneiro”. Na sequência, Deng Xiaoping, é sabido, assumira
o leme da RPC e conduziu o país no rumo perseguido há milênios, no sentido da
busca da estabilidade social. Não teria cabimento — no contexto de apenas duas
décadas de abertura da China ao exterior — que a liderança taiwanesa criasse
turbulência no caminho da grande nave chinesa, em direção ao progresso.No
momento atual, a República Popular já é considerada a segunda — ou talvez a
primeira — economia mundial. Já é capaz de competir — ou liderar — em setores
de tecnologia de ponta. Suas forças armadas projetam-se sobre o Mar do Sul da
China. Sua forma de governança, contudo, é objeto de crítica, no controle da
pandemia de COVID 19. Há desconfianças quanto ao tratamento de minorias
internas naquele país.Verifica-se, nessa perspectiva, que a RPC — ao contrário
do que pude aferir em Taipé, em 1999 — não é entendida mais simplesmente como
vítima de uma história que a colocara em situação de inferioridade. Hoje, a
República Popular da China é cobrada por seu sucesso nas áreas econômica e
tecnológica, bem como tem seu sistema de governança criticado no combate ao
vírus que nos assola e em matéria de direitos humanos. Daí, eventual
instabilidade através do estreito de Taiwan não contará com as mesmas simpatias
internacionais, demonstradas a Pequim em crises anteriores.(Fonte Noticias
Internacional Referencia)