Sem poder baixar salário, empresas adotam banco de horas negativo.
Sistema evita pagamento de horas extras no futuro e virou recurso
utilizado especialmente por comerciantes após novas restrições.
Empresas afetadas pelas
restrições de funcionamento por conta do combate à covid-19 estão aderindo ao
banco de horas negativo, também chamado de banco de horas “invertido”,
como uma espécie de última estratégia para evitar mais demissões e tentar minimizar
prejuízos, mantendo sua equipe de olho numa retomada dos trabalhos. Quase um
mês após o fechamento das portas no início de março, e ainda sem poder contar
com benefícios dados pelo governo em 2020, como o adiantamento de férias
individuais não vencidas e o programa que reduz salários e jornadas, empresas
estão deixando seus funcionários em casa acumulando horas não trabalhadas. O
valor que os empregados receberem por essas horas pode ser descontado no futuro
de horas extras que venham a ser feitas e que, portanto, não serão pagas. Pode
ainda resultar em descontos em salários e nas rescisões, caso previsto em
acordo coletivo. A estratégia tem sido adotada especialmente pelo
comércio, que aponta um cenário de falências a demissões em razão da pandemia e
das restrições. No estado de São Paulo, por exemplo, o comércio não
essencial, como lojas de roupas e calçados, deixou de operar com
portas abertas no dia 6 de março. Imediatamente, muitos lojistas concederem
férias vencidas aos funcionários. Eles retornaram num cenário de restrições
ainda maiores, a fase emergencial, que vai até o dia
11. Com os empregados em casa, a saída foi
adotar o banco de horas. Segundo Lauro Pimenta, dono de loja de roupas no
Brás, em São Paulo, todos os 18 empregados foram colocado nesse regime para
tentar minimizar os prejuízos. A ideia é reduzir despesas nos próximos meses
com as três horas extras pagas aos funcionários por trabalharem nas tardes de
sábado. Ele conta que o esquema começou a ser adotado no ano passado, e deu
resultado. “Apesar de todo o impacto da pandemia nas contas, esse banco ajudou
com as despesas e praticamente ficamos sem pagar horas extras até dezembro”,
conta. O comerciante
lamenta a demora para a reedição do Programa de Manutenção de
Emprego e da Renda, realizado pelo Ministério da
Economia no ano passado. A ação permitiu a redução de jornadas e salários ou a
suspensão de contratos, com o pagamento de valores aos funcionários pelo
governo, e permitiu mais de 20 milhões de acordos entre patrões e empregados. O
programa foi um dos usados por Pimenta e permitiu que nenhum funcionário fosse
demitido no período de restrições em 2020. Nesse ano, a demora para a concessão
do benefício já contribuiu para a demissão de quatro empregados, relata. “Quanto
mais demorar, pior será. As empresas estão sem caixa e acabam demitindo se
ficam desassistidas. Além disso, se não tiver um amparo social, não tem como as
pessoas ficarem em casa”, afirma. O Ministério da Economia vem anunciando desde
fevereiro que o programa será reeditado. Na terça-feira (30), o secretário
especial de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco, afirmou que a há pontos
fiscais a serem avaliados. O impasse estaria ocorrendo em razão da dificuldade
de finalização do Orçamento de 2021 do
governo federal, aprovado pelo Congresso, mas ainda não sancionado pelo
presidente Jair Bolsonaro. Outras lojas do Brás pretendem aderir neste ano ao
banco de horas negativo. É o caso da Romance Enxovais, que poderá adotar o
sistema já a partir desta semana para seus sete funcionários. O empresário
Richard Narchi, da marca de surfwear Rik Wil, afirma que já vem em um processo
de redução de custos para manter a empresa funcionando em meio às adversidades
trazidas pela pandemia. Ele também se preparou junto ao sindicato para adotar o
banco de horas negativo para os funcionários, já que o trabalho é maior na
empresa em meses como julho, dezembro e janeiro, exigindo horas extras dos
funcionários. “Há muitas empresas quebrando", afirma. "O banco de
horas negativo dá uma segurança em relação a uma despesa menor lá na frente”,
conclui. Reforma trabalhista Segundo
o advogado Rodrigo Nunes, sócio da área trabalhista do escritório Cascione
Pulino Boulos Advogados, a Reforma Trabalhista de 2017 trouxe a alteração do
artigo 59 da CLT, que passou a autorizar a implementação de banco de horas por
intermédio de acordo individual. “Essa mudança ofereceu maior flexibilidade,
bastando que o acordo seja por escrito e que a compensação ocorra dentro do
prazo de seis meses”, explica.Outra possibilidade de implementação do banco de
horas é por acordo verbal, se as horas forem compensadas no período de um mês.Nunes
chama a atenção para o fato de que o banco de horas é normalmente usado para
dar descanso após horas extras realizadas. Com a covid-19, ocorre o contrário.
“Interessante notar que o banco de horas é utilizado em circunstâncias normais
para a compensação de horas extras prestadas pelos empregados, que as compensa
posteriormente com folgas ou saídas antecipadas. Por força da pandemia, vem
sendo adotado o banco de horas negativo ou invertido”, diz.Em relação a
possíveis descontos em salário e rescisões, Rodrigo Nunes afirma que a prática
inicialmente contraria o princípio de irredutibilidade dos salários e que, no
caso do desconto na rescisão, indicaria ainda a transferência do risco do
negócio ao empregado.Esses descontos só seriam possíveis com intermediação do
sindicato, ou então com uma nova regra publicada pelo governo, como o programa
que permitiu redução de salários e jornadas. No caso de rescisão, há outro
ponto a ser observado: o desconto não pode exceder o equivalente a um mês de
remuneração do empregado. .( Fonte A Referencia Noticias Nacional)