Quando escrevi os cinco livros que compõem a série O Barulho e os Mártires, fiz uma análise crítica da Velha República, que gerou as oligarquias ancestrais, que encarnavam as elites em Goiás. Na Faculdade de Filosofia, me deparei com uma reflexão à luz da obra O Leviatã e produzi mais este curto ensaio.
A frase
“O Estado é um monstro de poucas cabeças dirigindo milhões de cabeças” ganha
ainda mais relevância quando analisamos a dinâmica da democracia contemporânea,
que muitas vezes assume características oligárquicas. O ideal democrático, no
qual o poder deveria emanar do povo e ser exercido em prol do bem comum,
frequentemente é desvirtuado. A realidade, em muitos casos, mostra um pequeno
grupo de políticos e suas redes de influência perpetuando-se no poder,
transformando o Estado em uma “oligarquia democrática” sustentada pela máquina
estatal e pelas ferramentas de comunicação modernas. Thomas Hobbes defendia a
concentração do poder no soberano para garantir ordem e segurança. Contudo, ele
alertava para os riscos da tirania, quando o poder não está sujeito ao controle
da sociedade. Nas democracias contemporâneas, essa tirania assume uma forma
sutil: a perpetuação de uma classe política que, embora eleita, age como uma
elite oligárquica. Os políticos, seus parentes, protegidos e aliados criam uma
rede de poder sustentada pela estrutura estatal. Esses grupos se filiam a
partidos que funcionam mais como máquinas eleitorais do que como espaços de
debate ideológico. A reeleição frequente de membros dessa classe, favorecida
pelo controle de recursos públicos e pela manipulação de narrativas, fortalece
essa “aristocracia moderna”. Se no passado o poder oligárquico era mantido por
meios tradicionais, como o controle econômico e alianças regionais, hoje ele é
reforçado pelo uso estratégico dos meios de comunicação e das redes sociais.
Políticos criam marcas pessoais e narrativas persuasivas, explorando algoritmos
e campanhas segmentadas para influenciar a opinião pública. As redes sociais,
que deveriam ser instrumentos de democratização da informação, muitas vezes são
utilizadas para consolidar a hegemonia de determinados grupos. A máquina
estatal e os recursos públicos financiam essas campanhas, garantindo
visibilidade constante e abafando vozes dissidentes. Assim, a promessa de
renovação política é frequentemente uma ilusão, com os mesmos grupos
controlando o poder por décadas. Essa “oligarquia democrática” tem semelhanças
com regimes aristocráticos ou monárquicos. Embora o discurso oficial promova a
igualdade de oportunidades e o voto universal, a prática revela que o acesso ao
poder político está restrito a poucos. Essa concentração lembra o modelo da
Velha República no Brasil, onde famílias e grupos políticos regionais
monopolizavam o poder, mantendo as massas à margem do processo decisório, pois
o poder político é perpetuado por meio de alianças partidárias, controle de
verbas públicas e estratégias de comunicação que criam uma falsa sensação de
representatividade. Os cidadãos são tratados como espectadores de uma
democracia teatral, enquanto os atores principais – políticos e suas redes de
influência – permanecem intocados. A crítica ao Estado, como um monstro de
poucas cabeças, ganha novos contornos na democracia, onde o ideal de
representatividade é frequentemente usurpado por uma elite política que
perpetua seu poder. À luz do clássico O Leviatã, é possível reconhecer a
importância de um poder centralizado para garantir a ordem. No entanto, a
centralização excessiva nas mãos de poucos, mesmo em regimes democráticos,
resulta na formação de oligarquias que se assemelham a sistemas aristocráticos
ou monárquicos. Para evitar que o monstro do Estado se transforme em uma força
opressora, é essencial que as “milhões de cabeças” – os cidadãos – exerçam
vigilância constante, participem ativamente do processo político e exijam
transparência e renovação. O uso ético das redes sociais e a educação política
são ferramentas indispensáveis para combater a manipulação e romper o ciclo de
poder oligárquico, resgatando o verdadeiro sentido da democracia como governo
do povo, pelo povo e para o povo. *Abílio Wolney Aires Neto é Juiz de Direito da 9ª Vara Cível de Goiânia. Cadeira 9 da Academia Goiana de Letras, Cadeira 2
da Academia Dianopolina de Letras, Cadeira 23 do Instituto Histórico e
Geográfico de Goiás-IHGG, Membro da União Brasileira de Escritores-GO dentre
outras. Graduando em Jornalismo.
Acadêmico de Filosofia e de História. 15 títulos publicados. (Fonte Jornal Opção Notícias)
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